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27 de Abril de 2024

Quebra do sigilo profissional médico ou dentista e os crimes sexuais envolvendo paciente criança ou adolescente

Existe alguma flexibilização para o Médico ou Dentista?

Publicado por Getúlio Costa Melo
há 4 anos

Tema de grande dúvida perante profissionais da medicina e odontologia, que fazem atendimentos em crianças e/ou adolescentes, é se podem ou não quebrar o sigilo profissional quando tomarem conhecimento de algum crime sexual envolvendo o paciente na qualidade de vítima.

Antes de ingressar no âmago do tema, imperioso enfatizar que na ciência do Direito existe um campo destinado à interpretação das normas jurídicas – a Hermenêutica Jurídica. Como bem explica o jurista português José Joaquim Gomes Canotilho: “a interpretação das normas constitucionais é um conjunto de métodos, desenvolvidos pela doutrina e pela jurisprudência com base em critérios ou premissas (filosóficas, metodológicas, epistemológicas) diferentes, mas, em geral, reciprocamente complementares” .

Vários são os métodos de interpretação aceitos pela doutrina, porém, não importa o método utilizado, pois o objetivo central do seu uso é proporcionar ao operador do direito o verdadeiro significado da norma frente ao caso concreto analisado.

POIS BEM. Tanto a Constituição Federal (artigo 227), quanto o Estatuto da Criança e do Adolescente (artigo 4º), dispõem que é obrigação, não apenas da família ou do Estado, mas também da sociedade em geral, assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.

Por outro lado, o artigo 73 do Código de Ética Médica e o artigo 14 do Código de Ética Odontológica regulam sobre o sigilo profissional, proibindo a revelação de informações obtidas durante sua atuação profissional, o que vale (salvo exceções), também para algumas requisições judiciais ou investigativas.

No entanto, inexiste no nosso sistema jurídico direitos ou deveres absolutos, que não aceitam algum tipo de flexibilização diante de algum caso específico analisado. Esta visão, por exemplo, é defendida pelo Supremo Tribunal Federal:

"Não há, no sistema constitucional brasileiro, direitos ou garantias que se revistam de caráter absoluto [...] pois nenhum direito ou garantia pode ser exercido em detrimento da ordem pública ou com desrespeito aos direitos e garantias de terceiros".

Nos casos envolvendo suposto crime cometido em paciente criança ou adolescente, independe da vítima ou do seu representante legal a abertura de uma investigação ou processo criminal, pois o interesse sobre a resolução do tema em face de criança ou adolescente é público (da sociedade), isto é, é da competência do Ministério Público conduzir a ação criminal e não da vítima/representante legal.

Além disso, o Decreto-Lei nº 3688/41 (Lei das Contravencoes Penais), disciplina que (artigo 66, inciso II) deixar de comunicar à autoridade competente crime de ação pública, de que teve conhecimento no exercício da medicina ou de outra profissão sanitária, desde que a ação penal não dependa de representação e a comunicação não exponha o cliente a procedimento criminal.

Ou seja, o médico ou dentista que, embasado na anamnese e demais documentos de atendimento, estiverem perante situações de indícios de crimes sexuais cometidos em desfavor de paciente, especialmente de criança e/ou adolescente, TEM O DEVER DE COMUNICAR AO MINISTÉRIO PÚBLICO OU, PELO MENOS, AO CONSELHO TUTELAR, pois a investida jurídica não depende da vítima ou representante legal, além de ter, o profissional da saúde, o risco de responder criminalmente pela não comunicação.

BIBLIOGRAFIA

(CANOTILHO, Direito constitucional e teoria da Constituição, 6. ed. p. 212-213)

(Julgado HC 103.236, rel. min. Gilmar Mendes, j. 14-6-2010, 2ª T,DJEde 3-9-2010)

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